Page 93 - XXIII Prêmio Tesouro Nacional 2018
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Tema – Equilíbrio, transparência e planejamento fiscal de médio e longo prazo – Fernando Covelli Benelli


                                         1 Introdução




                  As Instituições Fiscais Independentes (IFIs, ou Conselhos Fiscais – CFs) e as
            regras fiscais são modelos de instituições que ganharam relevância teórica e política
            após a constatação de que os governos raramente conseguem se comportar como
            planejadores centrais, ou seja, que são incapazes de conduzir a política fiscal de
            modo que atendam ao socialmente ótimo no longo prazo. Em geral, a existência
            de incentivos políticos distorcidos em conjunto com a racionalidade limitada dos
            eleitores e governantes geram déficits excessivos – o chamado viés deficitário da
            política fiscal –, os quais reduzem gradativamente o bem-estar social.
                  A desconfiança com relação à habilidade do governo em promover uma
            trajetória sustentável da dívida começou a surgir com a crise de endividamento
            do início dos anos 1970. Países desenvolvidos e em desenvolvimento passaram
            a apresentar expressivos resultados fiscais negativos, e a tendência ao acúmulo
            da dívida manteve-se nas três décadas seguintes. Os formuladores de política
            de  linha  keynesiana  postulavam  que  os  gastos  excessivos  seriam  compensados
            pela poupança gerada nos períodos de bonança, enquanto os mais afeitos à linha
            ortodoxa advogavam que os mecanismos de mercado – através da redução do
            espaço fiscal suscitado pelo aumento dos juros e dos spreads bancários – se encar-
            regariam de retomar o curso saudável do endividamento. Ambas as soluções
            traziam a vantagem de prescindirem da criação de instituições, eliminando os
            custos sociais e econômicos a elas associados. Contudo, suas predições mostra-
            ram-se equivocadas.

                  Sendo assim, a partir de meados dos anos 1980, uma série de países passou
            a adotar regras fiscais; em 2015, seu número chegava a cerca de cinquenta. Esse
            crescimento motivou a elaboração de estudos com o objetivo de avaliar a efeti-
            vidade das regras em moldar o comportamento fiscal do governo.  Um resultado
                                                                             1
            quase unânime dessas pesquisas aponta para uma correlação positiva e signifi-
            cativa entre o resultado fiscal e as regras fiscais. Entretanto, a análise da inferência
            causal, na maioria dos casos, fica comprometida pela ausência de um tratamento
            adequado do problema da endogeneidade.

                  A suspeita desse tipo de problema deriva das evidências controversas de que os
            países alteram seu comportamento fiscal logo após a instauração da regra e o mantêm
            de acordo com as diretrizes que ela estabelece pelos períodos seguintes.  Em outras
                                                                                2

            1     Ver ALESINA et al., 1999; ALESINA; PERROTI, 1995; AYUSO-I-CASALS et al., 2006; BADINGER; REUTER,
                2017;  DEBRUN; KUMAR, 2007;  EICHENGREEN; HAUSMANN;  VON HAGEN, 1999;  HALLERBERG;
                STRAUCH; VON  HAGEN, 2009;  HEINEMANN et al., 2013;  NERLICH; REUTER, 2013;  BOHN; INMAN,
                1996; POTERBA, 1996; TAPSOBA, 2012; VON HAGEN, 1992; VON HAGEN; HARDEN, 1995.
            2     Ao realizarem uma investigação descritiva dos dados, Debrun e Kumar (2008) constatam que, numa seleção de países

                                             Finanças Públicas – XXIII Prêmio Tesouro Nacional – 2018 91
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