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Tema – Equilíbrio, transparência e planejamento fiscal de médio e longo prazo – Fernando Covelli Benelli


          palavras,  a  hipótese  da  criação  pura  e simples de instituições  com  capacidade  de
          “amarrar as mãos” dos políticos encontra suporte empírico duvidoso.  A causalidade
                                                                           3
          reversa é outra hipótese recorrente ligada a essa questão: países com contas públicas
          mais equilibradas tenderiam a adotar instituições desse tipo como forma de sinalizar
          a boa qualidade de sua política (POTERBA, 1994). Uma boa sinalização reduziria o
          problema de informação assimétrica entre os eleitores e o governo, que, assim, aumen-
          taria suas chances de reeleição (DEBRUN;  KUMAR, 2007). Outrossim, variáveis
          omitidas correlacionadas simultaneamente com as regras fiscais e com o desempenho
          fiscal podem ser mais uma fonte de endogeneidade. Por exemplo, a preferência do
          eleitorado pela sustentabilidade da dívida geraria, a um só tempo, melhor desempenho
          fiscal e a criação de instituições garantidoras desse compromisso. Finalmente, muitos
          dos estudos citados utilizam algum tipo de índice  que reflete a “força” da instituição,
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          com base em itens como abrangência, base legal, rigor na observância do cumpri-
          mento das regras etc. Tais medidas são frequentemente ordinais por natureza, o que
          dificulta a comparação entre si (BADINGER; REUTER, 2017).

               Estudos especificamente orientados  a  mensurar os impactos dos CFs no
          resultado fiscal, embora mais recentes, sofrem dos mesmos problemas citados
          acima para as regras fiscais. E, devido ao número significativamente menor de
          publicações,  ainda  não  incorporaram  muitas  das  tentativas  para  o  tratamento
          daqueles problemas exibidos nas avaliações dessas regras.
               Mesmo no contexto de causalidade reversa, os CFs ainda podem gerar
          impactos positivos na condução da política fiscal. Visto que a informação assimé-
          trica entre os eleitores e o governo constitui mais uma fonte de viés deficitário –
          p. ex., orçamentos pouco transparentes tendem a ser excessivamente dispendiosos
          (ALESINA et al., 1999) –, a atenuação dessa assimetria pode criar condições para
          um desempenho fiscal mais condizente com o socialmente desejável (DEBRUN;
          KUMAR, 2008). Em outra linha da literatura, a criação de instituições fiscais
          aumenta a credibilidade do governo na condução da política fiscal, o que possi-
          bilita a redução das taxas de juros cobradas pela emissão de dívida soberana
          nos mercados financeiros (HALLERBERG; WOLFF, 2006) e abre espaço para a
          contenção do viés deficitário.

               Dado o exposto até aqui, fica claro que a estimação dos efeitos das insti-
          tuições sobre o desempenho fiscal não é tarefa fácil. A tentativa mais imediata
          de aplicação de variáveis instrumentais fica logo comprometida pela escassez de


             da União Europeia, apenas o Reino Unido e a Bélgica exibiam evidência desse tipo de comportamento.
          3     Debrun e Kumar (2008) não encontram estimativas significativamente distintas ao empregar variáveis instrumentais
             para  as  regras  fiscais.  Já  Badinger  e  Reuter  (2017),  ao  selecionar  instrumentos  supostamente  mais  adequados,
             encontram o inverso. Em uma amostra de países da União Europeia, De Haan, Moessen e Volkerink (1999) confirmam
             empiricamente a presença de causalidade reversa.
         4     Por exemplo, o Fiscal Rule Index (FRI), elaborado pelo FMI, ou índices de CFs, construídos por alguns autores, como
             Debrun e Kumar (2007), Coletta e Infantino (2015) e Maltritz e Wuste (2015).

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