Page 159 - XXII Prêmio Tesouro Nacional 2017
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Tema – Equilíbrio e Transparência Fiscal – Sérgio Wulff Gobetti, Rodrigo Octávio Orair e Frederico N. Dutra


            uma questão preliminar, anterior a qualquer outra: o que se quer exatamente do
            indicador de ajustamento ao ciclo?
                  Os indicadores de ajustamento ao ciclo têm sido utilizados para diferentes
            finalidades: como parâmetro normativo da política fiscal, como indicador de
            sustentabilidade fiscal, como medida de impulso fiscal ou de orientação da política
            fiscal e, ainda, como variável-chave para mensuração dos efeitos da política fiscal
            sobre o produto. E, como bem pontuava Blanchard (1990), não há como esperar
            que um único indicador ofereça uma boa resposta a questões tão diferentes.

                  Cada  finalidade  pontuada  requer  um  ou  mais  indicadores específicos,
            que podem fazer uso do conceito de ajustamento ao ciclo, mas com diferentes
            benchmarks sobre o ponto de referência para o cálculo (PIB potencial, PIB
            tendencial ou média móvel) e com diferentes modos de abordar o problema da
            endogeneidade entre as variáveis envolvidas.

                  Quando o foco é mensurar os efeitos multiplicadores da política fiscal sobre
            a atividade econômica, o mais apropriado é utilizar um indicador bem restrito
            de discricionariedade, o mais exógeno possível em relação ao ciclo econômico,
            evitando que as estimativas sejam contaminadas na presença de medidas anticí-
            clicas (DEVRIES et al., 2011). Por isso, os estudos sobre os episódios de consoli-
            dação fiscal focados na confirmação ou contestação da hipótese da contração fiscal
            expansionista (desde GUAJARDO et al., 2011, a ALESINA et al., 2017) passaram a
            abandonar o indicador de impulso fiscal derivado do cálculo de balanço ajustado
            ao ciclo e a adotar a chamada “abordagem narrativa ou histórica” (ROMER;
            ROMER, 2010) para estimar as medidas discricionárias adotadas pelo governo.
                  Ao se basear na análise dos documentos oficiais, essa abordagem evita os erros
            de mensuração indireta da discricionariedade, particularmente quando estamos em
            momentos extremos do ciclo e os parâmetros de ajustamento são instáveis; ademais,
            ela permite identificar diretamente as medidas fiscais e selecionar aquelas que efeti-
            vamente são exógenas. Essa alternativa, que também pode ser utilizada no cálculo do
            impulso fiscal amplo (incluindo medidas anticíclicas), é particularmente vantajosa
            com relação às receitas, em função das dificuldades apontadas em se estimar as
            elasticidades; contudo, apresenta limitações por depender da qualidade das infor-
            mações disponíveis e de critérios para definir, no caso das despesas, quanto de sua
            evolução é efetivamente espontânea e quanto depende de decisões (ou indecisões)
            legais e discricionárias, dependentes ou não do ciclo.

                  Para contornar essas dificuldades, a Comissão Europeia (2013) propôs um
            indicador de esforço fiscal (nesse sentido, uma medida de orientação da política
            fiscal) que faz uso de uma “abordagem mista”, ou seja, adota o enfoque narrativo
            (e os documentos oficiais) para mensurar o impulso pelo lado das receitas, mas
            estima o impulso das despesas por sua variação entre dois períodos, sem excluir


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