Page 160 - XXII Prêmio Tesouro Nacional 2017
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Tema – Equilíbrio e Transparência Fiscal – Sérgio Wulff Gobetti, Rodrigo Octávio Orair e Frederico N. Dutra
o impacto de possíveis evoluções espontâneas, como é o caso do crescimento dos
gastos com benefícios previdenciários fruto de fatores demográficos.
Contudo, ao se apurar a variação das despesas entre dois pontos no tempo, é
preciso ponderar ou comparar essa evolução com o crescimento do PIB ou, o que
é mais correto, com alguma medida de PIB potencial ou tendencial. Isso significa
que, embora essa “abordagem mista” evite as dificuldades de estimar o compo-
nente cíclico das receitas por meio de um mecanismo de ajustamento baseado em
uma relação não linear entre receitas e produto, ela não escapa da necessidade de
se basear em alguma estimativa de PIB potencial ou tendencial.
O problema é: como evitar que a volatilidade nas estimativas de PIB potencial
ou tendencial, tal qual verificado atualmente em inúmeras economias, contamine
as análises da política fiscal?
Para lidar com essa situação, a Comissão Europeia passou a adotar como
referência para mensuração do esforço fiscal de cada país a média móvel das
estimativas de PIB potencial, suavizando as mudanças na tendência ao longo
do tempo e permitindo que, dessa forma, a política fiscal possa ser avaliada em
relação a um benchmark mais estável.
Esse tipo de procedimento equivale, na prática, a decompor o componente
estrutural do orçamento derivado do ajustamento ao ciclo convencional entre dois
subcomponentes: um mais efetivamente discricionário (referenciado na tendência
de médio prazo) e um resíduo que pode ser explicado por mudanças de curto
prazo da tendência e que não se confunde com o componente cíclico propria-
mente dito. Dito de outra forma, os resultados fiscais correntes são influenciados
pelas oscilações meramente cíclicas, pelas mudanças no PIB potencial e pelas
ações discricionárias (ou ausência delas) em termos de gasto e receitas.
Assim como não é correto confundir os efeitos das mudanças no PIB
potencial com o componente cíclico, também não é correto embutir esses efeitos
na mensuração do impulso fiscal. Ainda mais quando não existe muita certeza
sobre a real dimensão do hiato do produto e sobre a persistência dos choques de
oferta e demanda sobre a tendência de longo prazo, ponto de que trataremos no
próximo capítulo.
Em síntese, essa abordagem sugere que, para determinados propósitos, os
resultados fiscais devem ser segregados em mais do que dois componentes: um
puramente cíclico, um segundo “estrutural” relacionado à discricionariedade da
política fiscal e um terceiro componente “estrutural” também, mas que reflete
mudanças no PIB potencial.
Do ponto de vista da sustentabilidade da política fiscal, ambos os compo-
nentes estruturais devem ser levados em consideração: de um lado os resul-
158 Finanças Públicas – XXII Prêmio Tesouro Nacional – 2017